Cabo Verde lidera Grupo D e mira classificação inédita contra Camarões

Quando Rui Águedo Agualusa, técnico da Seleção Nacional de Cabo Verde subiu ao microfone antes da partida de terça‑feira, a ansiedade era palpável. O duelo contra Seleção Nacional de Camarões no Estádio Nacional de Cabo Verde, na ilha de Santiago, marcaria a oitava rodada das Eliminatórias Africanas para a Copa do Mundo de 2026 e poderia definir quem garantiria a vaga histórica.

Contexto da disputa no Grupo D

O Grupo D nunca esteve tão apertado. Até o confronto direto, Cabo Verde acumulava 16 pontos em sete jogos – cinco vitórias, um empate e uma derrota – enquanto Camarões vinha com 15 pontos, invicto, graças a quatro triunfos e três empates. Cada ponto valia ouro, porque a classificação depende de quem fechar a tabela com a maior pontuação após duas rodadas finais.

Historicamente, a seleção cabo‑verdiana tem surpreendido: quatro vitórias consecutivas antes do duelo – contra Líbia (2 a 0), Maurício (2 a 1), Angola (1 a 0) e novamente Maurício (3 a 0) – mostraram um futebol ainda em fase de maturação, mas com muita disciplina tática.

O confronto direto: Cabo Verde x Camarões

O jogo aconteceu às 13h (horário de Brasília), 16h UTC, sob céu parcialmente nublado. A torcida, que encheu o Estádio Nacional de Cabo Verde, cantava em uníssono, criando um clima que lembrava as noites de festa em Mindelo. De um lado, o técnico Rui Águedo Agualusa (conhecido como Bobô), de 53 anos, exibiu sua estratégia de "pressão alta e transição rápida"; do outro, o técnico de Camarões, Léonardo Nascimento, apostou na experiência dos veteranos.

O primeiro tempo foi marcado por poucas chances claras. Roberto Lopes, apelidado de Pico, tentou abrir o placar aos 12 minutos, mas o chute cruzado encontrou o poste. Aos 27, Telmo Arcanjo recebeu um cruzamento de Fadel Mansour e cabeceou por cima da barreira, porém o goleiro camaronês fez defesa segura.

No intervalo, Agualusa retomou a entrevista concedida ao jornalista Rivaldo Fernandes e, entre tropeços de frase, enfatizou: "Precisamos estar mentalmente fortes, jogar com tranquilidade mas sem perder a atenção. Camarões é a seleção mais forte da África, mas aqui temos a casa, a vibração, e isso pode mudar o rumo".

O segundo tempo trouxe mais emoções. Aos 58 minutos, Sidney Lopes Cabral recebeu um passe filtrado e, de primeira, acertou no canto esquerdo, colocando Cabo Verde na frente. A reação de Camarões foi imediata: um gol de cabeça de Samuel Eto’o Jr. aos 71 equalizou o placar. Nos minutos finais, ambas as equipes buscaram o gol da vitória, mas o árbitro encerrou a partida em 1 a 1.

O empate manteve Cabo Verde na liderança, porém com apenas um ponto de vantagem. Para garantir a classificação, a equipe ainda precisava vencer a Líbia na próxima rodada e contar com um tropeço camaronês contra a Maurício.

Reações dos jogadores e da comissão técnica

Logo após o apito final, o capitão dos Tubarões Azuis, Willy Semedo, elogiou a postura da equipe: "Sabíamos que seria difícil, mas o apoio da torcida nos deu força. Ainda temos muito a lutar".

Já Roberto Lopes, ainda ofegante, disse ao microfone: "Foi um jogo de altos e baixos, mas acreditamos que temos as condições de chegar ao mundial. Cada ponto conta".

A comissão de Agualusa, por sua vez, destacou a necessidade de manter a concentração: "Não podemos descansar nos laudos. O próximo desafio contra a Líbia será decisivo".

Impacto na classificação e próximos compromissos

Com 17 pontos após o empate, Cabo Verde entrou na fase final das eliminatórias no topo do Grupo D. O próximo confronto, marcado para 8 de outubro, seria contra a Líbia, no Estádio Internacional de Trípoli. A partida terminou 3 a 3, um verdadeiro thriller que manteve Cabo Verde com 19 pontos, dois à frente de Camarões.

A última rodada, no dia 13 de outubro, colocaria Essuatíni (eSwatini) diante dos cabo‑verdianos, enquanto Camarões enfrentaria Angola. Na prática, basta uma vitória de Cabo Verde ou um empate combinado com derrota ou empate de Camarões para garantir a vaga.

Se a classificação fosse confirmada, Cabo Verde se juntaria ao seleto grupo de países com menos de 600 mil habitantes a disputar um Mundial – atrás apenas da Islândia (400 mil) que chegou a 2018. Uma curiosidade que não passou despercebida: a cidade brasileira de Contagem, Minas Gerais, tem população superior ao conjunto das ilhas cabo‑verdianas, o que faz a conquista ainda mais simbólica.

Análise histórica e comparações regionais

• Primeira classificação de Cabo Verde para a Copa do Mundo (se confirmada).
• Segundo país mais populoso a se classificar, ficando atrás apenas da Islândia.
• Desempenho superior ao de outras seleções africanas de tamanho similar, como Guiné‑Bissau (200 mil) e São Tomé e Príncipe (220 mil).
• Relação de pontos acumulados (19) destaca a consistência defensiva – apenas 6 gols sofridos em 8 jogos.

Especialistas em futebol africano, como o professor Mário Azevedo da Universidade de Lisboa, apontam que a estratégia de Agualusa, baseada em transição rápida e compactação defensiva, tem sido crucial para o sucesso da equipe, sobretudo contra adversários tecnicamente superiores.

O que vem a seguir?

Os próximos dias serão de tensão máxima. A comissão de Cabo Verde já organizou um treinamento fechado em Praia, focado em bolas paradas, que foram decisivas nos confrontos contra Maurício e Angola. Enquanto isso, a Federação de Futebol de Camarões trabalha para ajustar o meio‑campo, já que a falta de criatividade tem sido apontada como ponto fraco.

Para o torcedor, a expectativa se mistura com nostalgia: a possibilidade de ver a bandeira cabo‑verdiana tremulando em estádios múltiplos da América do Norte será, para muitos, a realização de um sonho que parecia distante há poucos anos.